PEÑA FLAMENCA

A palavra “peña” significa agrupamento, reunião, grupo. Aplicada ao flamenco, aparece pela primeira vez em Granada.(Fonte: “Fundación de la Peña de la Platería”, que afirma ser a primeira a surgir, em 1949).

“Tudo começou como começam as grandes obras que perduram no tempo: quase sem querer”.

Jerónimo Roldán Pardo

Assim inicia a palestra sobre a história das peñas flamencas de Andalucía, Jerónimo Roldán Pardo, em 2012, realizada na XII Semana Cultural “Memorial Pepita Caballero”, organizada pela Asociación Cultural Flamenca, e disponível no youtube.

Originalmente, a peña flamenca surgiu como uma reunião de aficionados, interessados e admiradores da arte flamenca, que se encontravam informalmente para falar sobre os artistas desta arte, as músicas e performances dos mesmos, assim como para fazer flamenco e sobretudo praticar o cante, mote principal destas reuniões.

Segundo Pablo Parilla González, também palestrante do mesmo evento, o interesse por descobrir um flamenco em estado primitivo, sem contaminação alguma, em reuniões feitas por intelectuais, curiosos, estudantes, burgueses, turistas, pessoas de diversas índoles em busca de uma arte única, também teria sido uma das motivações do nascimento das peñas.

História

Não haveria dados do por quê se adotou o nome “Peña”, mas à época do seu surgimento, a rejeição de uma parte da sociedade ao flamenco era evidente, sendo até então uma arte executada com poucos recursos em locais simples como teatros, “plazas de toros” e cinemas de verão, através de espetáculos que eram conhecidos como “óperas flamencas”, entre 1.920 e 1.955.

O flamenco, por ser executado por “el pueblo llano” (pessoas simples de origem humilde), era considerado pela cultura oficial uma música menor. No regime de Franco(1.936/1.975), foi utilizada para criar um estereótipo musical que se denominou “españolada”, o qual serviu para que uma parte da sociedade fosse contra ela, talvez também por oposição a esta ditadura, colocando no mesmo saco o flamenco “de verdade”.

No final dos anos 50 surgem os festivais flamencos. Como embrião do surgimento das peñas estão as tertúlias flamencas situadas nas províncias de Málaga, Granada e Sevilla. Seu nascimento vem substituir em grande parte aos clássicos lugares de celebração destes rituais de cante, toque e baile, que estavam ficando relegados ao esquecimento.

Os locais onde se faziam as reuniões informais passaram a ser chamados de bar (palavra de origem inglesa), e ao se popularizarem, em algum momento alguém resolveu colocar o cartaz: “se proíbe el cante”, como se o cante fosse algo passível de se proibir. Os demais estabelecimentos passaram a imitar este comportamento, e o flamenco perdeu seu local natural de reunião. A princípio era feito também por cantaores aficionados que se reuniam nesses bares.

Peña Torres Macarena

A “Peña Torres Macarena”, de Sevilla, por exemplo, procede de reuniões de cante que se faziam na oficina de um ceramista. As “peñas” e os “peñistas” portanto seriam fruto de uma grande injustiça cometida contra uma arte que é celebrada e admirada em todos os cantos do mundo, e começaram a surgir ao não haver mais a possibilidade de reuniões nestes locais entre aficionados para falar sobre flamenco, assim como fazer.

Um artesão “platero”, aficionado ao flamenco, Manuel Salamanca, reunía um pequeno grupo de aficionados em sua pequena oficina. Todos os sábados, terminando os trabalhos, se reuniam sentados em uma mesa com vinho e petiscos de bacalhau, comentavam os estilos e as letras de músicas flamencas, e todo aquele que pudesse cantar, era escutado com respeito. Esse teria sido o embrião das peñas flamencas. No final da década de 60, um grupo de aficionados decidiu criar a “Peña Fosforito”, e posteriormente fundaram a “Peña flamenca La Plateria”, sendo registrada como associação sem fins lucrativos. Já existia outra peña flamenca registrada oficialmente desde 1958, “Juan Breva de Málaga”, que também reclama o título de ser a mais antiga.

A peña se tornou então uma reunião de aficionados, independente e paralela aos grandes circuitos, com uma proposta de consumo interno e fechada em grande medida a quem era de fora. Muitas tiveram lugar em zonas periféricas das grandes cidades, onde eram formadas por pessoas chegadas de zonas rurais ou de bairros tradicionais destas cidades. Serviram, além de reunião de aficionados em torno a arte, de instrumentos de construção de novos vínculos sociais então inexistentes, possuindo um forte componente de identidade local, convertendo-se em um ponto de encontro, sobretudo de vizinhos.

Pouco a pouco foram se tornando centros culturais, entidades formalizadas, encarregadas e responsabilizadas da conservação, promoção e difusão da arte flamenca, com estatutos pelos quais se regem e perante os quais assumem estes compromissos.

O ambiente das Peñas Flamencas

Suas sedes se constituem muitas vezes de decorações típicas andaluzas, personalizadas nas cadeiras e mesas coloridas, paredes revestidas de fotos dos artistas que ali já pisaram ou que são homenageados. Em muitas delas se promovem aulas de cante, toque e baile, assim como se busca incentivar novos artistas, abrindo o espaço para apresentações e concursos.

Peña La Platería

Na Espanha, algumas são mantidas pelos sócios, outras vezes recebem subvenções governamentais, sendo queixa de alguns a politização destes estabelecimentos, ás vezes utilizados em benefício de algum político local. Também se outorga como missão destas peñas manter a “pureza” do cante flamenco, buscando realizar recitais de cante com o acompanhamento de guitarra flamenca.

Em 1977 se criou em Sevilla a primeira “Federação de Peñas flamencas de Andalucía” e posteriormente se criou a confederação, em 1985, em Málaga.

No total existem 350 peñas federadas na região de Andaluzia. Mais de 50% dos festivais flamencos são organizados por peñas flamencas. Elas estão presentes em diversos países além da Espanha, como Alemanha, França, Itália e Suécia, entre outros, o que demonstra a universalidade desta arte, e como ela se estabeleceu como patrimônio imaterial da humanidade.

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