DA ESTÉTICA AO MERGULHO NA LINGUAGEM FLAMENCA

Ah, esse tal de flamenco é matéria para muitas vidas e feliz daquele que escolheu se entregar à ele nessa vida.

Mesmo que a paixão aconteça pelo contato com a força, a beleza e a natureza particular do flamenco, o amor verdadeiro por ele chega quando saímos da superfície e mergulhamos cada vez mais profundamente na sua essência de troca e de possibilidades.

Para quem não o conhece muito, o flamenco reúne a dança, o canto, a guitarra, a percussão do cajón e as palmas como elementos primordiais que trabalham juntos recriando a criação cada vez que essa reunião acontece.

Começamos a aprender uma coreografia, uma música e um toque mas quando nos reunimos com os outros elementos é onde a arte flamenca realmente acontece.

Um código de baile comunica como o baile seguirá, um som a mais do sapateado altera a sequência combinada, um alongamento de cante modifica uma parte do todo (mesmo que coreografada). Um respiro pode ou não ser necessário (e bailaor e cantaor se comunicam sem palavras, ao vivo, para que ambos sigam ou respirem juntos). Um acorde diferente na guitarra pode nos pedir para bailar um pouco mais sobre a melodia. Uma subida de intensidade do corpo impele o cajón a aumentar sua intensidade. A tranquilidade do corpo pode diminuir todo o volume musical que preenchia o espaço. E entre mil possibilidades, entre uma parte e outra, caminhamos juntos para uma grande explosão de sons, movimentos e sentimentos como uma grande gargalhada conjunta ou um potente silêncio profundo numa conversa entre amigos.

Todo esse diálogo se dá sem palavras e, na maioria das vezes, sem combinação prévia. A expressão flamenca acontece no que chamamos no método coreológico flamenco de: pontos de mobilidade, que são momentos específicos onde o corpo, a voz, a harmonia e a percussão não só conversam, mas principalmente mudam o rumo do tom e o conteúdo daquela conversa naquele momento.

A conversa não é aleatória e exige dominar os recursos do seu instrumento, bem como conhecer a interação dos outros elementos. É através da clareza do compasso que nos une e do conhecimento de onde (e como) comunicar dentro dele que essas intervenções acontecem.

Mesmo sem essa consciência, o flamenco segue sendo apaixonante, visceral e de extrema beleza graças às suas características, porém, quando ficamos na superfície estética perdemos a melhor sensação que ele pode nos oferecer que é de pertencimento, integridade, entrega e principalmente, a unidade.

É muita coisa? É sim … mas vale à pena mergulhar.

O preenchimento infinito destes encontros flamencos e os momentos em que a essência dessa arte se incorpora na vida artística de um aluno são indescritíveis.

Sou muito grata àqueles que se propõe a mergulhar comigo e que, através das suas conquistas, partilham comigo momentos de felicidade e união através da arte.

Cylla Alonso

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